terça-feira, 15 de novembro de 2011

O Palhaço (2011)


Selton Mello acertou novamente!! Em seu segundo longa-metragem como diretor (o primeiro foi "Feliz Natal") o rapaz consegue arrancar lágrimas e risos, numa mistura ideal. O Palhaço é um filme feito para agradar, seja aqueles que vão sem pretensão ao cinema, ou àqueles que criam expectativas lidas através de críticas, o filme agrada, e surpreende.

“Eu tinha um sonho com esse filme de fazer uma coisa que não se faz muito aqui no Brasil. Um filme que seja popular, mas que também seja refinado cinematograficamente. Que respeite a inteligência do público, que seja um filme claro, sem ser explicativo”, explica Selton.

Ponto pra ele, conseguiu! Selton assina a direção, o roteiro e uma atuação de primeira como Benjamin, o palhaço Pangaré, que junto com o pai, o palhaço Puro Sangue (magnificamente interpretado por Paulo José) tocam o Circo Esperança com sua trupe, viajando por cidadelas e oferecendo seu espetáculo à moda antiga.

Nesse processo, Benjamin mostra-se cansado e em crise existencial. Tá, concordo, pode parecer clichê demais o palhaço que pinta o sorriso e faz todo mundo rir, mas chora por dentro, mas aqui o clichê passa longe. Existem críticas sociais incrustadas nos risos, e tratadas com um certo tom de ironia que consegue causar a reflexão no público.

Benjamin então nos é apresentado como um ser humano cansado das funções e limitações de sua vida e tenta se posicionar de alguma maneira frente à essa inquietação que o aflige. O palhaço acredita ter perdido a graça e afirma não aguentar mais. A busca por um ventilador (objeto que é muito simbólico no desenvolvimento intelectual do filme) é uma metáfora para uma busca maior do personagem, que falar mais aqui pode atrapalhar a reflexão daqueles que ainda não viram.

No cinema nacional, como afirma Selton, a produção de filmes está diante de uma bifurcação, ou faz-se um sucesso de bilheteria, com um filme mais "popular" ou um filme mais autoral, visceral, para poucos. E obviamente, as telas de cinema mostram o primeiro deles. O Palhaço consegue romper com essa situação, oferecendo um filme que consegue ser delicioso de assistir, e ao mesmo tempo causar reflexões e abir espaço para criticidades sociais e também cinematográficas.

Percebi algumas influências, que parecem ser várias, mas três ficaram bem evidentes para mim, primeiramente, Bye Bye Brazil, que não tem como não vir a mente dos amantes do cinema nacional. Algumas pitadas de Tim Burtonm nas cores e em alguns figurinos dos personagens. E claro, Fellini com "Os Palhaços". Selton Mello consegue trazer ao público essas referências, mas sem deixar de ser extremamente criativo e singular.

Esse é o filme pra você esfregar na cara de quem ainda tem a pachorra de falar mal do cinema nacional, de dizer que falta qualidade, seja narrativa, poética ou técnica. Porque O Palhaço é um deleite de cinema, em sua completude, as atuações são ótimas, a fotografia boa, a trilha sonora consegue contextualizar ainda mais os personagens, a edição também não deixa falhas.

Eu sempre entendi que "entretenimento" e "arte" fossem difíceis de compatibilização (acho que isso vem dos conceitos acadêmicos que utilizo em meus trabalhos), mas estamos diante de uma obra que consegue essa mistura, de uma forma leve, singela e com qualidade. É isso, O Palhaço nos oferece qualidade!

"O gato bebe leite, o rato como queijo, e eu sou o palhaço"

domingo, 13 de novembro de 2011

A Árvore (2010)


Charlotte Ginsbourg é realmente uma excelente atriz, e isso mostra-se mais uma vez no longa A Árvore de Julie Berucelli. Gainsboug vive Dawn que tem que superar a perda do marido e ao mesmo tempo dar conta de quatro filhos.
Simone, sua filha de oito anos tinha uma relação muito próxima com o pai e sofre ao tentar superar a perda, a partir dos reflexos das tentativas de superação de sua mãe. É quando a criança acredita que a alma do pai está "reencarnada" na imensa figueira que a família tem em frente à casa. E começa a ter uma relação com a árvore. Escapismo, negação, alívio ou supervalorização do sofrimento, enfim, o importante aqui é que a árvore torna-se o símbolo mais importante da história.
Simbolismo é a palavra que descreve o filme, e são vários, inclusive alguns tendo uma particularidade interessante, que podem variar de acordo com as singularidades do espectador. Conceitos de árvore, casa, mãe, e tantos outros são aqui modificados e assumem concepções sentimentais.
A superação aqui é mostrada não como uma lição de moral de filme de sessão da tarde, mas como um processo singular do ser humano. A árvore torna-se um símbolo do sentimento da pequena Simone, parecendo que cria vida própria. Á uma visão mais superficial diria-se sobrenatural, mas como tratamos de simbolismo aqui, a coisa é mais profunda.
Em alguns momentos o filme parece se perder, deixando algumas questões em aberto, um mergulho mais profundo nas personagens de Dawn e Simone seria cabível no filme. A pressão social pelo reestabelecimento emocional também, por isso pode-se dizer que não estamos diante de um excelente filme, e sim de um bom filme. As etapas da superação do trauma são sutilmente elucidados, tanto para a filha, a esposa e o filho adolescente. Entretanto, uma dramatização maior poderia ser conseguida, aproveitando-se das excelente atuações de Gainsbourg e da pequena Morgana Davies (Simone).
São tanta pequenas questões não trabalhadas que não consigo elencar, Dawn é francesa, e mudou para a Austrália (onde o filme se passa) para viver com Peter (o falecido), isso evidencia o processo de busca por uma aceitação e um lugar de Dawn. A cena inicial do filme é de uma sensibilidade tocante.
Enfim, recomendo o filme, assistam e tirem suas conclusões. A trilha sonora é boa e as cenas são lindíssimas. O resultado final é bom, mas fica aquele sentimento de que poderia ter sido melhor...

sábado, 12 de novembro de 2011

Eyes Wide Open (2009)



Vamos lá, volto ao Blog, mas dessa vez eu vou dar continuidade (será?). O filme que me despertou o desejo de voltar à escrita é Eyes Wide Open, um filme israelense do diretor Haim Tabakman. O filme mostra dois homens judeus ortodoxos encarado a homossexualidade e o desejo que sentem pelo outro. Ezri (Rans Danker) chega à Jerusalém e começa a trabalhar no açougue de Aaron (Zohar Shtrauss), um homem casado e com um tanto de filho que não consegui contar.
Em meio à uma sociedade judaica extremamente conservadora, o relacionamento profissional dos personagens evolui e transforma-se em uma paixão "proibida". A questão importante do filme é discutir os limites que nós colocamos à nossa existência. Percebe-se em algum momento que Aaron luta com esse "pecado" durante a sua vida, mas encaixou-se na sociedade e nos pré-requisitos para ser "um servo de Deus". As influências do meio, seja da sociedade ou seja da religião influenciam profundamente essa postura de Aaron, mas em algumas expressões e falas percebe-se que ele próprio cria certos limites pra sua vida.
"Porque Deus criou o desejo?", Aaron prega à Ezri, e explica que o desejo existe para que possa ser superado, sendo que temos uma missão neste mundo inferior, e esse desejo deve ser evitado. Deus aqui é tratado como uma força (?) que está, constantemente, colocando provações para que os humanos possam evoluir e "se salvar", tipo uma professora brava do colégio, que fazia aquilo pelo seu bem. E a luta interna de Aaron, com o Deus judeu, a família e Ezri é mostrada de forma bem sutil.
Ezri sofre, pode-se dizer que ele é uma personificação do desejo e da provação de Aaron. "Uma obra-prima", que mostra-se fragilizado e necessitado de contato humano e por que não dizer de amor. Assim, o jovem oferece um amor libertador à Aaron, libertador e verdadeiro, que o fará sentir-se vivo, mas os limites são o obstáculo à essa vida. Sejam limites externos, mas principalmente os limites externos.
Pode parecer um pouco massante mais um filme de temática gay x preconceito, gay x religião, mas Eyes Wide Open é de uma beleza sutil. A fotografia do filme é bem colocada, cenas com um tom "pastel" elucidam o sentimento dos personagens, filme muito bem dirigido, escrito, filmado e atuado. A questão que fica é, quais limites a gente deve estabelecer à plenitude da existência? Precisa de limites, essa é a SUA verdade?